Os idiomas influenciam na forma de pensar?

Imagine viver em um mundo onde o tempo não é dividido em passado, presente e futuro, mas apenas em eventos que aconteceram ou não aconteceram ainda. Ou um mundo onde cores que você chama de “azul” e “verde” são vistas como tons completamente distintos, quase como se fossem outras realidades. Isso não é ficção: são formas de pensar moldadas por diferentes idiomas. E é aqui que entra a relação entre idioma e pensamento: será que a língua que falamos influencia a maneira como enxergamos o mundo?

A ideia de que a língua que falamos influencia nossa forma de pensar é conhecida como hipótese de Sapir-Whorf. Ela sugere que a estrutura da língua afeta a maneira como percebemos o mundo, organizamos pensamentos e tomamos decisões. Embora essa teoria tenha sido alvo de críticas por décadas, estudos recentes em neurociência cognitiva vêm trazendo evidências empíricas que dão novo fôlego à discussão.

Ver o mundo com outras palavras

Um dos exemplos clássicos vem dos falantes da língua guugu yimithirr, uma comunidade aborígine da Austrália. Eles não usam palavras como “esquerda” e “direita”, mas sim pontos cardeais: norte, sul, leste e oeste. Assim, em vez de dizer “o copo está à sua esquerda”, diriam “o copo está a sudoeste”. Isso os obriga a ter um senso espacial incrivelmente afiado, o tempo todo. Estudos mostram que esses falantes são, de fato, muito mais precisos ao se orientar no espaço.

Outro caso curioso envolve falantes do russo, que distinguem tons de azul com palavras diferentes. Em testes de tempo de reação, eles são mais rápidos para identificar nuances de azul do que falantes de línguas que usam uma só palavra para todos os tons. Isso indica que a língua pode, sim, afiar ou limitar nossa percepção — mais um exemplo da ligação entre idioma e pensamento.

Linguagem, memória e tomada de decisão

Estudos também mostram que a língua pode afetar a forma como lembramos de eventos. Numa pesquisa, falantes de espanhol e inglês assistiram ao mesmo vídeo de um acidente. Em inglês, os participantes descreviam o evento enfatizando quem causou o acidente (“he broke the vase”). Em espanhol, a descrição era mais impessoal (“se rompió el florero” – algo como “o vaso se quebrou”). Isso se refletiu nas memórias posteriores: os falantes de inglês lembravam melhor do agente causador.

Outro ponto intrigante está relacionado a idiomas que distinguem claramente o tempo futuro, como o inglês, e outros que não fazem essa divisão, como o alemão. Estudos apontam que falantes de idiomas com menor distinção temporal tendem a ser mais previdentes financeiramente e mais conscientes sobre saúde, talvez porque o futuro lhes pareça mais “presente”. São nuances que reforçam como o idioma influencia o pensamento de forma sutil, mas real.

Limitações e possibilidades da relação entre idioma e pensamento

A hipótese de Sapir-Whorf não defende que a língua determina o pensamento, mas que o influencia. Falantes de idiomas diferentes ainda conseguem aprender novas línguas e conceitos, mas podem ter mais dificuldade para pensar em certas ideias que sua língua nativa não expressa tão facilmente. A língua pode agir como um “molde cognitivo” que favorece certos tipos de pensamento.

No fim das contas, entender essa relação entre idioma e pensamento não apenas amplia nosso respeito por outras culturas, mas também nos ajuda a expandir nossas próprias possibilidades de pensamento.

Sugestão literária

idioma e pensamento

Através da lente da linguagem: Por que o mundo parece diferente em outras línguas?

Neste livro instigante, Guy Deutscher explora como as diferentes línguas moldam nosso pensamento, percepção e visão de mundo. A obra discute exemplos reais que revelam a profunda conexão entre linguagem e cognição.

Perguntas Frequentes

O que é a hipótese de Sapir-Whorf?

É a ideia de que a língua influencia a forma como pensamos e percebemos o mundo. Não determina, mas molda aspectos do raciocínio.

Idiomas diferentes realmente mudam a percepção?

Sim. Estudos mostram que falantes de diferentes idiomas percebem cores, espaço, tempo e ações de formas distintas.

A linguagem afeta a memória?

Afeta. A forma como descrevemos eventos influencia como lembramos deles posteriormente.

É possível mudar a forma de pensar aprendendo um novo idioma?

Sim. Aprender uma nova língua pode expandir suas estruturas mentais e formas de perceber o mundo.

Essa influência linguística é permanente?

Não necessariamente. Ela pode ser modificada por exposição a novos idiomas, culturas ou conceitos.